Filme Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças: realmente é possível apagar as memórias traumáticas?

01/12/2023 04:42:20 Author: Rodrigo Oliveira
   



 Já imaginou você conseguir apagar todas as suas memórias relacionadas ao seu ex superando o relacionamento sem nenhum tipo de sofrimento envolvido? Isso é possível na filme "Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças" (trailer abaixo), onde o protagonista chamado de "Joel" protagonizado por Jim Carrey, descobre que sua ex-namorada Clementine contratou um serviço clínico para o apagar suas memórias. Joel, para evitar tal sofrimento também contrata o mesmo serviço, que por sua vez, se baseia em sessões de uma espécie de Transcranial Magnetic Stimulation (TMS) enquanto dorme, um equipamento de neuromodulador não invasivo que utiliza estimulação eletromagnética para modular (estimular ou inibir) a atividade neuronal cortical de áreas cerebrais específicas. Ao lado temos uma imagem comparando o TMS com o equipamento utilizado por Joel para apagar as memórias no filme.


 
Mas o que a neurociência tem a dizer sobre isso? Realmente é possível apagar memórias traumáticas a fim de diminuir o sofrimento humano? São essas e outras perguntas que iremos tentar responder neste blog.  Os principais trabalhos realizados com extinção de memórias aversivas estão relacionados com memória ligadas a um estresse pós traumático.  Esse transtorno se baseia em episódios involuntários de perturbações psicológicas fisiológicas desencadeada por gatilhos que remetem algum evento traumático já vivido, como por exemplo agressão física ou sexual, assalto, sequestro, acidentes entre outros. Os sintomas envolvidos podem ser sudorese, náusea e tremores, prejuízos sociais, freezing (estado de choque), depressão, ou até mesmo desenvolvimento de outros transtornos como o transtorno dissociativo de identidade. o tratamento consiste em psicoterapia e medicamentos como antidepressivos e ansiolíticos. Porém, esses tratamentos muitas vezes não muito eficazes e apresentam alguns efeitos adversos deletérios, fazendo com que a busca para outras abordagens terapêuticas sejam mais viáveis.
 
Dessa forma, muitos trabalhos utilizando técnicas de neuromodulação e outros componentes farmacológicos na tentativa de "deletar" essa memória aversiva vem se destacando no meio científico. Trabalhos utilizando TMS, assim como o equipamento semelhante utilizado por Joel no filme em que já citamos, mostraram que indivíduos que tiveram a inibição da região do córtex pré-frontal, importante área envolvida no processo consolidação da memória de longo prazo, desenvolveram uma resposta psicofisiológica menor aos estímulos aversivos. Ou seja, eles ainda podiam lembrar do evento, mas os efeitos maléficos dessa lembrança não tinham o mesmo poder de ativar as mesmas respostas psicofisiológicas. Já outros trabalhos utilizando Deep Brain Stimulation (DBS), técnica que envolve o envio de corrente elétrica para regiões específicas do cérebro por meio de implante de microeletrodos intracerebrais, mostraram que dependendo dos parâmetros utilizados e momento do DBS, pode induzir o esquecimento de memórias aversivas. Estudos utilizando DBS de High frequency nas áreas CA1 e giro denteado do hipocampo durante ou depois de uma tarefa de aprendizagem ou aversiva em ratos pode piorar esse tipo de memória. Outros trabalhos ainda demonstraram que o DBS pode diminuir a ansiedade e vício a partir da melhoria de memórias de extinção, que são memórias novas de associação que sobrepõe uma memória original, podendo supostamente também sobrepor uma memória aversiva.


    Voltando para o universo do filme, outro personagem importante destaca-se, Patrick,  o técnico responsável pela instalação e manutenção do equipamento que apaga as memórias das pessoas. Patrick conhece se apaixona por Clementine durante suas as sessões de "TMS" que foram responsáveis por apagar suas memórias relacionadas ao seu ex (Joel). Após a "terapia" concluída, Patrick, conhecendo toda a história do ex-casal, começa a tentar implantar falsas memórias em Clementine baseadas em Joel na tentativa de conquistá-la assim como seu ex a conseguiu conquistar. Mas o que a neurociência tem a dizer sobre indução de falsas memórias? Isso também é possível? Um estudo mostrou que camundongos condicionados a um estímulo aversivo de choque e odor tiveram uma resposta comportamental e de memória associativa (memória associada ao evento aversivo)  semelhante a animais que que foram condicionados artificialmente por estimulação optogenética nas regiões do glomérulo específico olfatório (M72) e tegmental ventral (VTA), região relacionada a aversão ou recompensa. Isso pode facilitar a criação de um mecanismo artificial de proteção contra a formação de novas memórias aversivas mesmo você não sendo exposto a um evento traumático. 
 
   Sabendo de tudo isso, é imprescindível a realização de novos estudos relacionados com extinção de memórias aversivas como também de indução de memórias falsas para o surgimento de novas técnicas terapêuticas com intuito de diminuir o os efeitos deletérios do estresse pós traumático. Também é importante ressaltar que apagar completamente um fato traumático pode ter pontos negativos, já que se a memória episódio traumático vivido nos prepara para evitá-lo novamente, o que também acontece também no filme Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças, já que as lembranças felizes vividas ao lado de Clementine que foram apagadas, cria uma espécie de vazio na vida de Joel.




  Quer saber mais sobre extinção de memória? Assista nossa programação especial na Brain Tv Channel  dia 01 de dezembro de 2020 às 8h sobre extinção de memórias aversivas. Te esperamos ! Abaixo, organizamos um playlist sobre o assunto para você:








Referências :
 
Borgomaneri, S., Battaglia, S., Garofalo, S., Tortora, F., Avenanti, A., & di Pellegrino, G. (2020). State-Dependent TMS over Prefrontal Cortex Disrupts Fear-Memory Reconsolidation and Prevents the Return of Fear. Current Biology.
 
Tan, Shawn Zheng Kai, et al. "The Paradoxical Effect of Deep Brain Stimulation on Memory." Aging and disease 11.1 (2020): 179.
 
Gisella Vetere, Lina M. Tran, Sara Moberg, Patrick E. Steadman, Leonardo Restivo, Filomene G. Morrison, Kerry J. Ressler, Sheena A. Josselyn & Paul W. Frankland Nature Neuroscience volume 22, pages933–940 (2019)
 
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